Este ano ele será festejado como nunca, justamente quando completaria, não tivesse partido tão cedo, 73 anos de vida, com um monte de coisas em sua homenagem, desde um filme lindíssimo, Todas as horas do fim, de Eduardo Ades e Marcus Fernando, até a Balada Literária de São Paulo, do intrépido Marcelino Freire, evento cultural dos mais importantes do país, nesta edição 2017 esparramada também por Teresina, cidade natal do nosso poeta, e Salvador, onde concluiu o ensino médio, as três capitais louvando, quiçá o Brasil inteiro também, através de matérias em jornais e televisões, quem bem merece, no caso Torquato Neto, e deixando, claro, o ruim de lado,  esse filho único de Heli da Rocha Nunes, defensor público, e Maria Salomé da Cunha Araújo, professora primária, que ainda meninote gostava de ler Machado de Assis, acredite se quiser, autor complexo e psicológico,  e pasme, desdobramento natural, já rabiscava os primeiros versos: “O meu nome é Torquato / O de meu pai é HELI / O de minha mamãe SALOMÉ / E o resto ainda vem por aí”, como veio de fato por meio da Tropicália, movimento que chacoalhou a arte nacional e mexeu com os comportamentos  da época, final dos anos 60 e início dos 70, de braços dados com os baianos,  sendo tido, geralmente, como um deles, por viverem tão próximos, participando de passeatas contra a ditadura e festivais de música, tendo nascido daí muitas parcerias importantes, hoje consagradas na MPB, a exemplo deGeleia Geral, manifesto-síntese da zoeira criada por eles, segundo opinião de críticos respeitados: “Um poeta desfolha a bandeira e a manhã tropical se inicia / Resplandente, cadente, fagueira num calor girassol com alegria”, uma dobradinha de Torquato e Gilberto Gil, e, não poderia faltar, Mamãe, coragem, entre Torquato e Caetano Veloso, interpretada divinamente por Gal Costa, letra que faz sangrar ao tocar em assuntos delicados envolvendo partida, separação e escolha pessoal: “Mamãe, mamãe não chore / A vida é assim mesmo eu fui embora / Mamãe, mamãe não chore / Eu nunca mais vou voltar por aí / Mamãe, mamãe não chore / A vida é assim mesmo eu quero mesmo é isto aqui”, ele que depois, vislumbrando voos mais altos, zarpou pro Rio a fim de fazer curso superior – jornalismo, mas não concluiu -, embora tenha passado, até por uma questão de sobrevivência, em redação dos jornais cariocas Correio da Manhã, Jornal dos Sports e Última Hora, nesse último assinando uma coluna, Geleia Geral, que bombou entre a galera ligada em cultura, arte e algo mais, não vacilando em deixar o país, durante o auge da repressão política, em companhia da esposa Ana Araújo, rumo a Londres onde se encontravam os amigos baianos, retornando algum tempo depois ao Brasil com outros interesses artísticos, a sétima arte no caso, protagonizando filmes alternativos em super8, quer no papel de ator ou diretor, pouco importando, afinal quem sabe faz a hora / não espera acontecer – Nosferatu, de Ivan Cardoso, Adão e Eva do paraíso ao consumo, de Edmar Oliveira e Carlos Galvão, e o Terror da Vermelha, dirigido por ele mesmo, películas hoje consideradas cult, tudo produzido, algo inacreditável, em apenas dez anos, uma vez que Torquato Neto tinha pressa e, após comemorar seu aniversário, resolveu abriu o gás e encantar-se de vez, dizendo que pra ele, em bilhete de despedida, chegava e pronto, sem antes fazer um pedido repleto de ternura e humildade: “Vocês aí, peço o favor de não sacudirem demais o Thiago. Ele pode acordar”, sendo o corpo do nosso poeta enterrado aqui, na terrinha onde nasceu, num túmulo do cemitério São José, centro da cidade, cujo túmulo continua  bastante visitado por fãs e admiradores, mesmo depois de 45 anos da fatídica madrugada de 10 de novembro de 1972, ele que deixou a vida, parafraseando Vargas, a fim de entrar no seleto grupo dos ícones da contracultura brasileira, sem pedir nada a ninguém e sem fazer concessões, muito menos alisando a cabeça de quem escolhe a arte de versejar: Escute, meu chapa: um poeta não se faz com versos. É o risco, é estar sempre a perigo sem medo, é inventar o perigo e estar sempre recriando dificuldades pelo menos maiores, é destruir a linguagem e explodir com ela (…). Quem não se arrisca não pode berrar.”