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O coração de Rita Hayowrth anda um tanto acelerado: uma extrassístole levemente alucinada deixa a moça sorrindo pelos cantos. Isso ocorre com alguma frequência e nessas horas ela finge que não é com ela, mas desta vez Rita Hayworth tranca a porta, fecha os olhos, respira fundo e logo já está desembarcando em Paris, levando nas mãos apenas o pequeno coração palpitante. Hoje Rita Hayworth está particularmente confiante. Ela ergue os braços e aponta o coração para o sol, pálido, mas suficiente. O coração de Rita Hayworth começa a piscar, indicando para a moça o caminho a ser seguido. Cada passo de Rita Hayworth faz o coração piscar mais rápido, e um pouco mais, e mais um passo e o coração pisca ainda mais rápido. Rita Hayworth atravessa toda a Paris e causa algum estranhamento. Até que a dois passos de Pigalle o coração de Rita Hayworth se acende por inteiro e brilha tão intensamente que ilumina dois quarteirões inteiros da Frochot. Rita Hayworth olha para os lados e o coração parece lhe querer voltar pela boca. A moça vê a casa número 1 e pensa: “O número um de todos os amores desse mundo está aqui”. Mais uma vez Rita Hayworth fecha os olhos e suspira, e assim Rita Hayworth já está dentro da pequena casa. O coração de Rita Hayworth, é bom que se saiba, não diferencia x de y, como qualquer coração que se preze deveria fazer. Há uma voz que canta. A voz abraça Rita Hayworth, que tem agora o coração batendo novamente dentro peito e no ritmo que ela sempre achou o melhor de todos. A voz se insinua lentamente, e Rita Hayworth está feliz como nunca quando a voz morde delicadamente seu lábio inferior, e mais feliz ainda quando a voz entra suavemente por todos os poros já então completamente livres de qualquer cobertura, e infinitamente feliz quando sente o cheiro da voz e percebe que a voz tem cheiro de grama úmida em manhã de inverno. Rita Hayworth entende nesse momento todo o sentido da frase que tatuou há nove anos na coxa esquerda: “Let the seasons begin, it rolls right on, let the seasons begin, take the big king down”. E dorme, profundamente.